What's WAM?
 
CONTRIBUTIONS: OLIVIA F. DE OLIVEIRA

This article is 765 words long.
Key words: Van Eyck. Bo Bardi. Brasil. Salvador de Bahia.



PORTUGUES
 




YOUR OPINION
OTHER CONTRIBUTIONS




AUTOR
Olivia Fernandes de Oliveira (1962), arquitecta graduada en la Universidad Federal de Bahía. En 1989, cursa estudios de arquitectura en el Instituto Universitario de Archittetura de Venecia; en 1990, cursa el programa de máster "Historia: Arte, Arquitectura y Ciudad" en la escuela de arquitectura de Barcelona. Actualmente se dedica a concluir su tesis doctoral sobre el espacio y el tiempo en la arquitectura de Lina Bo Bardi.

Olivia Fernandes de Oliveira (1962) arquiteta graduada na Universidade Federal da Bahia. Em 1989, segue o curso de arquitetura no Istitutto Universitario de Architettura di Venezia, e no ano seguinte aporta na Universidade Politécnica de Barcelona para cursar o master "Historia: Arte, Arquitectura, Ciudad". Atualmente se dedica a concluir sua tese de doutorado a respeito do espaço e tempo na arquitetura de Lina Bo Bardi.


 
Folhas e Folias. Relato de un encontro com Aldo Van Eyck.
por Olivia F.de Oliveira


RESUMEN
Conheci Aldo Van Eyck, através de Lina Bo Bardi. Nos anos sessenta, Lina descreveu com entusiasmo a Bahia para Aldo, despertando-lhe uma imensa curiosidade. Mas, só recentemente, passados mais de trinta anos deste contato com Lina, Aldo retornou ao Brasil para participar de um vídeo, produzido pela televisão holandesa justamente sobre a obra de Lina e visitou, pela primeira vez, a cidade de Salvador. Não fosse isto, não o teria acompanhado até o Recôncavo, uma das regioes mais apreciadas por Lina na Bahia. O seguinte relato nasce deste ambiente nostálgico de descobertas e frustraçoes diante deste outro cenário que é a Bahia de hoje, mas estrutura-se num curto-circuito entre a obra de Lina Bo Bardi e a de Aldo Van Eyck, causado por um artigo "hospedado" na revista WAM.



Quando acompanhamos Aldo Van Eyck a Cachoeira, uma coisa prendeu minha atenção: ele e sua esposa Hanny iam colhendo diversas folhas por onde passávamos. Primeiro, uma imensa folha de bananeira, logo, uma folha muito verde e comprida; depois, uma folha de amendoeira vermelha cor de sangue, outra com pintinhas negras, e outra, e outra. Aquilo me agradava. Comecei a ajudá-los, mostrando-ihes novas e diferentes folhas; isto fazia-me sentir mais próxima a eles. Hanny me contou que há anos mantinham este hábito; por onde viajavam, recolhiam exemplares de folhas do lugar. Curiosa, imaginei a casa deles na Holanda e todas essas folhas ali. Como estariam?. Todas juntas?. Empilhadas ou misturadas?. Classificadas? Uma a uma, com nome científico?. Por ordem alfabética?. Por países?. Por tamanhos?. Po cores?. Em uma sala especial?. Fixadas a parede?.

Não me atrevi a perguntar. De um lado, pelo meu deficiente inglês, de outro, por não me sentir no direito. Durante algum tempo, pensei nisto. Naquele gesto, algo me deixara comovida.

(Figura 1- foto Van Eyck em Cachoeira)
(Figura 1- foto Van Eyck em Cachoeira)


Meses depois, abro a revista WAM e vejo um desnho de Van Eyck, onde uma árvore é desenhada ao lado de uma folha. Entre elas, um símbolo de igualdade, ambas envolvidas por um único círculo. Prontamente, recordei-me de Van Eyck abrindo caminho e penetrando por entre as bananeiras do quintal do convento de São Francisco do Conde, e minutosdepois, saindo com aquela enorme folha e um grande sorriso nos lábios, igual ao de um menino que acaba de receber um presente.

(Figura 2- Desenho de Aldo: árvore= folha e Poema
(Figura 2- Desenho de Aldo: árvore= folha e Poema "Say leaf ö say people")


Vendo aquele desenho, era evidente que Aldo levava consigo uma folha, e também toda a bananeira, de onde havia furtado a folha, e todo aquele "bananeiral", e toda a cidade de São Francisco do Conde, e o Recôncavo, e a Bahia, e... no entanto, Aldo levava ainda mais, levava o homem que plantou aquela bananeira, levava Lina que ihe convencera vir à Bahia; levava vida, levava gente."Say leaf ö say people". Gente que se encontraria com muito mais gente naquele lugar da Holanda, preparado cuidadosament por Aldo e Hanny.

Pensei em Lina desenhando os répteis e as folhas da mata atlântica, e nas folhas de pitanga espalhadas pelo chão, com que ela sempre festejava a inauguração de suas obras. Esta práctica de forrar o chão com folhas é bastante comun nas festas populares e religiosas do nordeste.

(Figura 3 ö Estudos de Lina para montagem da Exposição no Ibirapuera)
(Figura 3 ö Estudos de Lina para montagem da Exposição no Ibirapuera)


Eliade esclarece que "qualquer que seja a complexidade de uma festa religiosa sempre se trata de um acontecimento sagrado, que teve lugar ab origene e que se faz presente ritualmente. Os participantes se fazem contemporâneos ao tempo mítico. Em outras palavras: "saem" de seu tempo histórico- isto é, o tempo constituído pela soma de acontecimentos profanos, pessoais e impessoais- e se enlaçam com o tempo primordial, que sempre é mesmo, que pertenece à Eternidade" . O tempo deixa de transcorrer, deixa de poder ser contado nos relógios para ser tempo presente- Jetztzeit- nos dizeres de Walter Benjamin. Esta "consciência de fazer saltar o continuum da história é propriamente das classes revolucionárias no instante de sua ação".

Recordei-me, ainda, quando, uma vez, Chango contou sua experiência na inauguração do Solar do Unhão. Ele dizia que à medida que as pessoas iam caminhando sobre as folhas espalhadas no chão, o perfume de pitanga ia se exalando no ar, aumentando de intensidade e preenchendo todo o espaço. Através do olfato, as pessoas tinham a possibilidade de perceber que estavam, cada vez mais, acompanhadas. Este perfume era igual a PRESENÇA, igual que VIDA.

(Figura 4 öFoto inauguração da Exposição Bahia no Ibirapuera 1959)
(Figura 4 öFoto inauguração da Exposição Bahia no Ibirapuera 1959)


Imaginei todas estas pessoas; negros e mestiços, amarelos e brancos, vermelhos e verdes, índios e africanos, conquistadores e conquistados, holandeses e portugueses, mortos e vivos, numa única festa inaugural, organizada por Lina, sobre o tapete de folhas colhidas por Aldo. Neste "dia de festa" cairiam os ponteiros de todos relógios da face da terra.

(Figura 5 öFoto aquarela de Lina para Banquete de Inauguração da Casa do Benin na Bahia- 1986)
(Figura 5 öFoto aquarela de Lina para Banquete de Inauguração da Casa do Benin na Bahia- 1986)


Fontes de imagens: n Poemas-desenhos de Van Eyck: "El interior del Tiempo y otros escritos" in: WAM- Web Architecture Magazine nª 2, que "hospeda" a publicação Circo nª 37, Madrid, 1996, onde originalmente foram traduzidos e publicados os textos de Aldo Van Eyck. n Aquarelas de Lina e Foto da Exposição Bahia no Ibirapuera: Arquivo Lina Bo e P.M. Bardi.



Olivia F. de Oliveira, Arquitecto









Web Architecture Magazine All rights reserved